EwErToN...
O corpo frágil, a dor inútil,
os passos firmes sobre o rio de seu próprio sangue
A voz calma, baixa, triste,
a sensação de que lágrimas é só o que existe
A beira do mar, pés descalços,
face alva e olhar perdido,
o jovem vê sua única saída e salvação
As mãos geladas e vermelhas,
os braços marcados pela solidão e medos que o assombram
Joelhos na areia, olhos fechados,
visão turva do mundo de torturas
Ele trás consigo a vontade de morte,
aprendeu a dizer adeus com gestos tímidos
Ele sabia que era isso que deveria fazer
As ondas traziam até ele o simples pensamento
de que ele tinha certeza: Mortos não voltam
Ele não voltaria para a vida,
não sofreria
Tudo o que precisava fazer era morrer,
como sempre sonhara
O sangue escorria, a dor o consumia por inteiro,
mas nada o pararia naquele momento
Ele repetia para si mesmo: os mortos não voltam,
nunca mais
Não desistiria até que, à noite ou dia,
seu espírito sentisse-se em paz
Ele já não conseguia guardar-se intacto,
pois não via o por quê
Não importava o que ele teria depois de morte
Seja o que for, é melhor do que o mundo
qualquer coisa é melhor que esta vida
A força de seu ódio era descontada em si mesmo
Não seria uma grande perda para o mundo,
ele pensava
Iria doer, ele sabia que iria
Mas isso realmente não importava
Podia doer, precisava doer
a dor o faria saber que estava morrendo,
e nada seria mais gratificante do que isso
O pensamento continuava firme:
os mortos não voltam, nunca
Devagar, sem pressa alguma, sem medo,
a lâmina fina e brilhante é suja de sangue
Dois cortes, nada mais,
a dor que as lágrimas causam enquanto a pele alva
se torna vermelha
As faixas brancas antes usadas para conter o sangue,
agora soltas, sendo levadas pelo vento
E num gesto rápido, doloroso e quase imperceptível por sua rapidez
o grito mudo, a dor infernal,
a perda da noção do que se passava a sua volta
Até que a dor some, o mundo some,
a vida não existe mais dentro dele
A areia vermelha, a lua cheia,
e mais uma estrela no céu aveludado
Porque ele tinha razão:
os mortos não voltam,
nunca mais.